MST: O uso da violência na luta pela Reforma Agrária
No dia 23 de março cerca de 300 manifestantes do Movimento Sem Terra invadiram a fazenda da família do presidente Fernando Henrique, em Minas Gerais. Dois dias depois, a fazenda do sócio da família do Presidente, no Pontal do Paranapenama, foi invadida. O fato causou perplexidade ao país e trouxe novamente à pauta um problema muito antigo no Brasil: a necessidade da Reforma Agrária. A invasão à fazenda da família de Fernando Henrique no dia 23 durou 22 horas e terminou com a prisão pela Polícia Federal de 16 líderes do MST, após a intervenção do Governo, do Exército e do Incra. A invasão causou indignação em Fernando Henrique Cardoso, principalmente devido à forma como os manifestantes expuseram a privacidade do Presidente e de sua família. Cenas de manifestantes deitados na cama de Fernando Henrique e de sua mulher foram mostradas para todo o país. Dois dias após a primeira invasão, integrantes do MST ocuparam a Fazenda Santa Maria, no Pontal do Paranapanema, de propriedade do agro-pecuarista Jovelino Carvalho Mineiro, sócio da família do presidente Fernando Henrique Cardoso na Fazenda Córrego da Ponte, em Buritis, Minas Gerais. Segundo líderes do movimento, a invasão foi uma retaliação ao Governo por causa da prisão dos sem-terra. Segundo o MST, os negociadores do Incra prometeram que, caso os manifestantes desocupassem a fazenda de FHC, não seriam presos. Os 16 líderes do movimento foram presos e transferidos para Brasília. Além disso, o Ministro da Justiça, Aloysio Nunes Ferreira, negou que essa opção tivesse sido dada aos manifestantes. O caso provocou a demissão de dois funcionários do Incra, que se disseram traídos pelo Governo, que garantira que ninguém seria preso. Protesto — No dia 26 de março, cerca de 150 manifestantes do MST marcharam até o centro de Buritis, onde fizeram uma manifestação em frente ao Fórum contra a decisão da justiça de negar o pedido de relaxamento de prisão dos líderes presos no domingo, após a desocupação da fazenda dos filhos de Fernando Henrique. Durante a marcha, o coordenador regional do MST, Gilmar de Oliveira, disse que as invasões vão triplicar se os líderes não forem soltos. Após a manifestação, os colonos decidiram acampar no centro de Buritis, em frente ao fórum. Os sem-terra também criticaram o ministro do Desenvolvimento Agrário, Raul Jungmann, por não cumprir o acordo de negociar as reivindicações do movimento. A presidência do PT — partido ao qual a maior parte dos manifestantes do MST é filiada — condenou a ação dos sem-terra. Segundo o presidente do partido, Luís Inácio Lula da Silva, a atitude do grupo não ajuda na luta pela Reforma Agrária. Lula, que é candidato à Presidência da República, defendeu a negociação pacífica para resolver o problema e criticou declaração do ministro da Justiça que ligou a invasão ao partido. Origens do MST — O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra, MST, tem origem nas lutas históricas do movimento camponês no Brasil ainda no século 19. Durante a primeira metade do século 20 ocorreram vários conflitos violentos por todo o país e na década de 50 estes grupos começaram a se organizar. Durante a ditadura, porém, os líderes destes movimentos foram presos e exilados. Só no fim do período militar, as lutas dos trabalhadores voltaram a acontecer. Essas lutas isoladas de ocupações de terra em quase todos os estados do Brasil acabaram se transformando num movimento nacional dos camponeses, que então ganhou o nome pelo qual é conhecido hoje em dia. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MST, foi oficialmente fundado em 1984. O MST tem bases em 91 cidades brasileiras. É um movimento nacional, ideológico e não pacífico, pois assume como estratégia a invasão de fazendas improdutivas para pressionar as autoridades nas desapropriações. Sua cúpula é composta por quinze militantes, mas só cinco têm seus nomes divulgados: João Pedro Stedile, Gilmar Mauro, Valter Assunção, Ênio Bonenberger e José Rainha. Reforma Agrária — O principal objetivo da reforma agrária é reverter a distribuição desigual de renda no Brasil para proporcionar terras e meios de fixação de famílias sem-terra no campo. Através dela seria possível absorver parte da população que vive nas cidades, ampliar o mercado consumidor nacional, gerar empregos, modernizar a agricultura brasileira, entre outras coisas. Além disso, a Reforma Agrária pode acabar com uma história de violência que marca os conflitos agrários no Brasil. Um grande argumento usado contra a reforma agrária é o alto custo e a ineficiência dos assentamentos, pois muitas famílias desistem das terras. Isso se dá, porém, pela falta de uma política que leve em conta as diferenças entre regiões e à falta de amparo ao homem do campo. Ainda assim, a renda média das famílias assentadas brasileiras, 3,7 salários mínimos, é superior à renda das famílias brasileiras que residem nas cidades. Outro argumento usado a favor da Reforma Agrária é que o custo do homem no campo é muito menor do que na cidade. São necessários muito mais investimentos para gerar um emprego na indústria do que no campo. O que movimentos como o MST e os defensores da Reforma Agrária afirmam é que a política de assentamentos feita pelo Governo no Brasil consiste muito mais em medidas paliativas para amenizar os conflitos no campo do que em um projeto que vise modificar a estrutura agrária. Quando a situação no campo torna-se muito tensa, os governos brasileiros promovem ações de impacto, como agilização temporária do processo de assentamentos. A sociedade, de modo geral, concorda com a Reforma Agrária. A grande polêmica é a forma como os movimentos dos trabalhadores rurais e mais especificamente o MST agem para lutar pelos direitos do homem do campo. Mas o uso da violência, as invasões sem critério em terras produtivas e a utilização de colonos como massa de manobra política têm feito com que a opinião pública acabe se posicionando contra o movimento. 