Acontece

Últimos acontecimentos mundiais comentados e contextualizados.

RH Dourado

19/11/2025
Ciência busca reproduzir o sangue mais raro

Entre os muitos mistérios do corpo humano, um dos mais intrigantes está justamente no sangue — esse tecido líquido que sustenta a vida. Dentro do sistema de grupos sanguíneos, que inclui classificações como A, B, AB e O, existe também o fator Rh, que indica a presença ou ausência de uma proteína específica na superfície dos glóbulos vermelhos. A maioria das pessoas possui essa proteína e, por isso, é Rh positivo. Uma parcela menor não a possui, sendo Rh negativo. No entanto, existe um caso raríssimo que foge completamente desse padrão: o Rh nulo, apelidado popularmente de “Rh dourado” devido à sua extrema raridade e grande valor médico.

O que torna o Rh nulo único é a ausência total de todos os antígenos do sistema Rh.Isso significa que uma pessoa com Rh nulo pode doar sangue para quase qualquer indivíduo com tipos Rh negativos raros, sendo uma espécie de “doação universal” dentro desse grupo extremamente seleto. Porém, o oposto não é verdadeiro: indivíduos com Rh dourado só podem receber sangue de outra pessoa com Rh nulo, o que torna transfusões em emergências um desafio médico significativo.

O sangue Rh nulo é tão raro que, desde sua identificação em 1961, pouquíssimos indivíduos no mundo foram registrados com esse tipo sanguíneo — as estimativas variam entre 40 e 50 pessoas ao longo da história, e menos de uma dezena são doadores ativos.Por isso as pessoas que têm esse fator devem armazenar o próprio sangue para uma eventual emergência.

Do ponto de vista biológico, a ausência dos antígenos Rh pode causar alterações nos glóbulos vermelhos, deixando-os mais frágeis e com vida útil ligeiramente menor. Ainda assim, muitas pessoas com Rh nulo vivem normalmente e descobrem essa condição apenas ao realizar exames específicos, em grande parte devido a investigações médicas ou doações de sangue.

A raridade desse tipo sanguíneo despertou o interesse crescente da comunidade científica, especialmente em relação à possibilidade de produzir sangue Rh nulo artificialmente. As motivações são tanto terapêuticas quanto estratégicas: garantir estoques seguros para quem depende desse tipo e ampliar o conhecimento sobre doenças relacionadas aos antígenos Rh. Hoje, as pesquisas mais promissoras envolvem três frentes principais.

A primeira é a engenharia genética aplicada a células-tronco hematopoiéticas. Nessa abordagem, cientistas editam células-tronco humanas usando ferramentas para “desligar” os genes responsáveis pelos antígenos Rh. A segunda linha de pesquisa envolve a produção de sangue em laboratório a partir de culturas celulares. Laboratórios já conseguiram criar pequenas quantidades de glóbulos vermelhos para fins de pesquisa e testes clínicos em pacientes com tipos sanguíneos raros. A dificuldade, no entanto, é a escala: produzir sangue suficiente para uma transfusão completa ainda costuma ser extremamente caro e logisticamente complexo. Por fim, existe a investigação sobre modelos animais  eneticamente modificados, nos quais os genes relacionados ao sistema Rh são alterados para compreender melhor como a ausência total desses antígenos afeta o organismo.

Embora a ciência ainda não consiga fabricar sangue Rh dourado em larga escala, os avanços dos últimos anos mostram que isso pode se tornar viável no futuro — especialmente à medida que as técnicas de edição genética e cultivo celular evoluem. A possibilidade de produzir tipos sanguíneos raríssimos em laboratório representa não apenas a chance de salvar vidas, mas também de expandir o conhecimento sobre a complexidade da biologia humana.

O Rh dourado, por enquanto, permanece uma preciosidade da natureza. Mas a ciência continua avançando para que, um dia, esse “ouro” biológico deixe de ser uma raridade e se torne mais acessível para quem dele precisar.

Utilizamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nosso site. Ao continuar, você concorda com nossa política de privacidade.